Em troca de apoio aos palanques estaduais e da formação de uma federação nas disputas proporcionais, o PSB driblou as principais resistências a uma aliança com o PT nas eleições de 2022.
As conversas iniciais entre as duas siglas se davam em relação ao apoio do PSB à candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições de 2022.
A última eleição presidencial que o PSB fez parte da coligação do PT no primeiro turno foi em 2010, na primeira eleição de Dilma Rousseff.
Mas, como mostrou a coluna Painel da Folha, a sinalização de Lula de que preferia ter Geraldo Alckmin (sem partido) como vice pelo PSD irritou líderes do PSB, que também negociam para abrigar o ex-governador a fim de indicá-lo para compor a chapa com o petista.
Os socialistas estavam com as conversas avançadas com o PT para formar uma federação partidária.
Além disso, algumas arestas regionais ainda precisam ser aparadas entre PT e PSB.
Em troca do apoio a Lula, o PSB quer o apoio do PT às candidaturas aos governos de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Acre.
“Nas relações pessoais e na relação política, existe uma coisa chamada reciprocidade. Estou confiante que chegaremos a um acordo em torno disso”, afirma o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira.
As tratativas estão avançadas na maioria dos estados, mas encontram obstáculos do PT em São Paulo e no Rio Grande do Sul, onde havia resistências iniciais no PSB a um pacto com o partido de Lula em 2022.
Mas a possibilidade de contar com o tempo de propaganda eleitoral do PT nas disputas majoritárias convenceu a maioria da ala do PSB que era contrária à aliança.
Os socialistas avaliam que é preciso ter inserções expressivas no rádio e na televisão para tornar as suas candidaturas competitivas, à exceção de Pernambuco, onde já governa desde 2007.
Em São Paulo, o ex-governador Márcio França era um dos que não davam aval imediato a um vínculo com os petistas.
Na campanha eleitoral de 2018, por exemplo, evitou se posicionar no segundo turno da disputa presidencial entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad para evitar que sua campanha à reeleição no estado fosse influenciada pelo movimento do antipetismo.
Apesar disso, França agora é um dos principais defensores de que o também ex-governador Geraldo Alckmin, que deixou o PSDB, se filie ao PSB para ser vice na chapa de Lula ao Planalto e, em paralelo, quer que o PT não lance Fernando Haddad para o governo de São Paulo.
Nesse cenário, França seria candidato a governador. Ele já avisou a interlocutores que, se Alckmin for disputar o Palácio dos Bandeirantes, não pretende concorrer com o ex-tucano por lealdade ao aliado, de quem foi vice-governador.
Para 2022, França não deverá contar com o mesmo arco de alianças de 2018, quando a sua coligação teve 15 partidos. Por isso, o apoio do PT é tido como vital para a sustentação do projeto político.
O xadrez também é complexo no Rio Grande do Sul, onde o PSB tem como principal líder o ex-deputado federal Beto Albuquerque, pré-candidato a governador. No estado, o partido faz parte da base aliada do governador Eduardo Leite (PSDB), mas quer o apoio do PT na sua coligação.
Beto Albuquerque era visto como contrário à aliança com o PT dentro do PSB, mas a cúpula da sigla sinaliza que o impasse está superado por parte do ex-parlamentar.
Ele fez diversas críticas ao PT nos últimos anos, inclusive na campanha eleitoral de 2014, quando foi candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva.
Até o momento, o PT mantém a pré-candidatura do deputado estadual Edegar Pretto, um dos principais opositores de Leite.
Cientes de que a decisão final deverá ser do diretório nacional do partido, sob influência de Lula, os petistas gaúchos temem que uma aliança com o PSB cause espanto na sua base eleitoral, que é contrária ao governo do PSDB, do qual os socialistas são aliados no território gaúcho.
Em Pernambuco, o prefeito do Recife, João Campos (PSB), era uma das principais barreiras a uma retomada da aliança com o PT.
Isso porque, em 2020, ele usou a estratégia do antipetismo na propaganda eleitoral para vencer a prima de segundo grau, a deputada federal Marília Arraes (PT), no segundo turno do pleito municipal.
Após uma reunião com Lula no início de outubro em São Paulo, João Campos não tem mais sinalizado a aliados divergências com a possibilidade iminente de o PSB integrar o palanque do ex-presidente e fazer uma federação partidária com o PT.
As federações partidárias são um novo elemento para as eleições de 2022 no Brasil.
Elas permitem que os partidos se unam nas disputas proporcionais nos 26 estados e no Distrito Federal e atuem de forma conjunta durante quatro anos no Legislativo, seja na Câmara dos Deputados ou nas Assembleias Legislativas.
O modelo difere das extintas coligações, que liberavam alianças nas campanhas eleitorais, mas os pactos eram desfeitos logo após o resultado das urnas.
O presidente nacional do PSB se mostra favorável a uma federação com outros partidos de esquerda. “Nas federações, estamos juntando forças políticas progressistas num único bloco que vai também atuar juntamente no Parlamento.”
“O eleitor não será enganado, vota no PSB, mas pode eleger [um deputado] do PT, do PC do B, mas são forças políticas muito mais próximas do que eram com as coligações, então o eleitor não será enganado.”
O deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG), um dos ainda resistentes à aliança com o PT, tem posição diferente da de Carlos Siqueira. Para ele, a federação e o apoio a Lula podem suscitar suspeitas de incoerência sobre ações anteriores do partido.
“Se estamos indo fazer federação com o PT, foi um equívoco o PSB ter apoiado o impeachment de Dilma em 2016.”
“Apoiamos a Lava Jato, fomos todos para essa apuração, e agora reconhecer que temos que voltar para o campo que a gente estava é um atestado daquilo que a gente estava equivocado e que nada disso [de errado] aconteceu”, afirma Delgado, entusiasta do lançamento do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), para o Planalto.
A expectativa do PSB é que, com uma federação com PT e PC do B e talvez PSOL, PV e Rede, a sua bancada possa ser ampliada dos atuais 30 para pelo menos 40 deputados federais em 2022.
O objetivo é ter maior poder de influência perante um eventual governo Lula e lançar potenciais candidatos a prefeito nas capitais em 2024.
“É um pragmatismo muito claro. O PSB perdeu suas resistências para salvar a sua pele na federação. Em vários estados, o partido sequer teria chapa para montar, então a gente teria um risco muito grande de derretimento da atual bancada, que gira em torno de 30 deputados federais, e define fundo eleitoral e tempo televisão”, diz Júlio Delgado.
Além de Júlio Delgado, ainda há outras pontuais divergências no PSB sobre uma aliança com o PT. É o caso do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, que não é entusiasta da aliança com Lula.
JHC, como é conhecido, tem uma peculiaridade local. Interlocutores do prefeito de Maceió lembram que uma eventual vitória de Lula ao Palácio do Planalto pode fortalecer o senador Renan Calheiros (MDB-AL) no estado e no Congresso Nacional.
Caldas, por sua vez, é opositor de Renan e do seu filho, Renan Filho, que é governador de Alagoas.
Nas eleições de 2022, o prefeito da capital de Alagoas deverá apoiar o senador Rodrigo Cunha (PSDB), aliado de João Doria, para o governo do estado, e o vice-prefeito de Maceió, Ronaldo Lessa (PDT), aliado de Ciro Gomes, para o Senado.
ENTENDA A FEDERAÇÃO PARTIDÁRIA
O que é
Permite a partidos se unirem em federação para escapar da punição da cláusula de desempenho, que retira recursos de siglas com baixíssima votação nas urnas. Elas são obrigadas a atuar de forma unitária pelos quatro anos seguintes às eleições
Partidos que discutem a possibilidade
PT, PSB, PC do B, PV e outros, da esquerda à direita, discutem formar as federações, cuja regulamentação foi definida pelo Tribunal Superior Eleitoral
Como foi a tramitação
O projeto das federações começou a tramitar e foi avalizado inicialmente pelo Senado, em 2015. Em 2021, a Câmara desengavetou e aprovou às pressas esse projeto a tempo de valer nas eleições de 2022 (pelo menos um ano antes). Após isso, o encaminhou à sanção de Jair Bolsonaro, que o vetou. O Congresso, porém, derrubou o veto presidencial e promulgou a lei.
José Matheus Santos/Folhapress