Em torno de 20% dos eleitores com alguma religião frequentam igrejas ou outros locais de culto onde dizem receber instruções sobre como votar, recomendações para escolher candidatos religiosos e orientações sobre como agir em relação à política, segundo pesquisa Datafolha.
As ações para influenciar o posicionamento dos fiéis são mais presentes entre evangélicos do que entre católicos, de acordo com o levantamento. Nos dois segmentos, porém, a maioria dos entrevistados (por volta de 80%) relata não haver tentativa de interferência no pensamento político.
Outras religiões não foram consideradas na análise porque as bases de dados são muito pequenas. Do total de entrevistados, 51% se declaram católicos e 26%, evangélicos.
O Datafolha ouviu 2.556 pessoas acima dos 16 anos em 181 cidades na quarta (22) e quinta-feira (23) da semana passada. A margem de erro da pesquisa, contratada pelo jornal Folha de S.Paulo e registrada no Tribunal Superior Eleitoral sob o número 09088/2022, é de dois pontos percentuais para mais ou menos.
A fatia dos eleitores que responderam seguir total ou parcialmente as instruções das igrejas também é superior entre os evangélicos. Esse grupo dá ao presidente Jair Bolsonaro (PL) vantagem na competição com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que encabeça a corrida eleitoral deste ano.
Na média geral da população, Bolsonaro tem 28% de intenções de voto no primeiro turno, enquanto Lula lidera com 47%. Entre evangélicos, o atual mandatário alcança 36%, ante 28% do adversário. Entre católicos, o petista se sai melhor: ele possui 42%, enquanto o rival registra 20%.
Bolsonaro tem a seu lado líderes de algumas das principais denominações evangélicas e costurou ao longo do mandato uma relação íntima com o setor. Não só em aparições públicas, com visitas a templos e cultos, mas também na articulação política, tendo na base a bancada evangélica do Congresso.
As perguntas sobre eventuais ações das igrejas para direcionar a ação política de seus seguidores só foram feitas aos entrevistados que declaram ter alguma religião. O instituto também quis saber em que nível eles acatam as sugestões vindas de pastores, padres e outros mestres.
Entre os 20% que relatam serem impactados por mensagens sobre como votar nas eleições, 6% dizem segui-las na íntegra (9% entre evangélicos e 6% entre católicos), 8% obedecem em parte (12%/6%) e 6% afirmam ignorá-las (7%/6%).
A tendência de evangélicos cederem mais do que católicos se mantém nos outros dois aspectos indagados: tanto a sugestão de dar preferência a candidatos religiosos na hora de ir às urnas quanto a orientação sobre como agir nos assuntos políticos de forma geral.
Entretanto, ao analisar somente o conjunto dos evangélicos, nota-se que os percentuais dos que dizem acatar em parte são superiores aos dos que afirmam aceitar plenamente as advertências dos líderes espirituais —o que indica que nem sempre a conversão nessa seara é integral.
Entre os eleitores menos escolarizados que têm religião, 26% vão a igrejas que apresentam ensinamentos sobre como votar —11% seguem as palavras totalmente, 8% parcialmente e 7% não seguem. Entre os que estudaram mais, os apelos atingem 15% deles, com subdivisões de, respectivamente, 2%, 5% e 7%.
A categorização por renda também demonstra resultados diferentes entre os que estão nas pontas quando se observa a disposição dos eleitores de acolherem ou não conselhos sobre o voto.
Segundo a pesquisa, 23% dos brasileiros cuja família ganha mensalmente até dois salários mínimos frequentam templos que tentam guiar suas escolhas. Desses, 8% seguem plenamente as recomendações, 8% em parte e 7% as desconsideram.
Já entrevistados cuja renda passa de dez salários são menos impactados por sugestões do tipo. Apenas 10% dos mais ricos dizem ouvir direcionamentos sobre o voto, sendo pouco significativas as parcelas que os abraçam integralmente ou em parte (4% em ambos) e os ignoram (2%).
Uma análise geral dos dados permite ver que homens (na comparação com mulheres) e pessoas mais velhas, mais pobres, menos escolarizadas e moradores do Centro-Oeste e do Norte tendem a endossar com maior facilidade as prescrições das igrejas sobre como proceder nas urnas.
Os índices entre eleitores de Lula e Bolsonaro que respondem assentir total ou parcialmente com as pregações sobre voto são muito próximos, o que configura empate técnico, sem grandes diferenças de comportamento entre um grupo e outro.
No quesito desobediência, isto é, a categoria dos que dizem não seguir as indicações, apoiadores do petista são mais efusivos do que os do atual presidente. Eles também são mais rebeldes em relação às orientações sobre optar por candidatos religiosos e dar ouvidos a instruções políticas em geral.
A disputa pelo voto religioso é uma das características da corrida presidencial deste ano. Como o Datafolha não havia formulado essas questões em outros levantamentos, não há uma série histórica de números sobre a presença do discurso político nas igrejas, o que impede saber de eventuais variações.
Joelmir Tavares/Folhapress